1. Quando o esoterista procura formular a sua filosofia no intuito de
comunicá-la aos outros, defronta-se ele com o fato de que o seu
conhecimento das formas superiores de existência resultou de um processo
diferente do pensamento habitual a de que esse processo só tem início
quando se ultrapassa o próprio pensamento. Portanto, é apenas nessa
região da consciência transcendente ao pensamento que podemos conhecer a
compreender a forma superior das idéias transcendentais, a apenas
aqueles de nós que são capazes de utilizar esse aspecto da consciência
estão aptos a comunicar essas idéias em sua forma original. Se
procuramos comunicar tais idéias a pessoas que não tiveram experiência
alguma desse modo de consciência, precisamos cristalizá-las na forma,
pois do contrário não conseguiremos comunicar nenhuma impressão
adequada. Os místicos utilizaram todos os símiles imagináveis na
tentativa de comunicar suas impressões; os filósofos perderam-se num
labirinto de palavras, a tudo isso de nada serviu para o adestramento da
alma não-fulminada. Os cabalistas, contudo, utilizam outro método. Eles
não tentam explicar à mente um conteúdo com o qual ela não é capaz de
trabalhar, mas dão-lhe uma série de símbolos em que deve meditar, a
estes lhe permitem armar gradualmente uma escada cognitiva para com esta
subir às alturas que estão fora de seu alcance. A mente é tão incapaz
de compreender a filosofia transcendental quanto o olho o é de ver a
música.
2. A Arvore da Vida - e devemos enfatizar esta afirmação _
constitui antes um método do que um sistema. Aqueles que a formularam
estavam perfeitamente cientes de que, para se obter a clareza de visão,
cumpre circunscrever o campo dessa mesma visão. Muitos filósofos
fundaram seus sistemas no Absoluto, mas essa é uma fundação movediça,
visto que a mente humana não pode definir ou compreender o Absoluto.
Outros tentaram utilizar uma negativa como fundamento, declarando que o
Absoluto é e sempre será incognoscível. Os cabalistas não empregam
qualquer desses artifícios, limitando-se a afirmar que o Absoluto é
desconhecido para o estado de consciência normal dos seres humanos.
3.
Por conseguinte, em função dos objetivos de seu sistema, os cabalistas
lançam o véu sobre certo ponto da manifestação, não porque nada há aí
para descobrir, mas porque a mente, como tal, não pode ultrapassar esse
ponto. Quando a mente humana atingir o seu estágio mais alto de
desenvolvimento, a quando a consciência conseguir desligar-se dela,
ficando, por assim dizer, sobre seus ombros, poderemos então penetrar os
Véus da Existência Negativa, como são eles chamados. Mas, tendo em
vista os propósitos práticos, só podemos entender a natureza do cosmo se
estivermos dispostos a aceitar os Véus como convenções filosóficas,
compreendendo que eles correspondem a limitações humanas a não a
condições cósmicas. A origem das coisas é inexplicável nos termos de
nossa filosofia. Por mais longe que remontemos em nossas pesquisas às
origens do mundo da manifestação, encontraremos sempre um estágio de
existência anterior. É apenas quando aceitamos lançar o Véu da
Existência Negativa sobre o caminho que remonta aos primórdios que
podemos obter uma base na qual se pode fundar a Causa Primeira. E essa
Causa Primeira não é uma origem desprovida de raízes, mas, antes, uma
Primeira Aparição no plano da manifestação. A mente não pode it mais
além, mas devemos lembrar sempre que cada mente remonta a distâncias
diferentes e, para algumas, o Véu deve ser lançado num determinado ponto
e, para outras, em outro bem distante. 0 homem ignorante não vai além
da concepção de Deus como um ancião, de longa barba branca, sentado num
trono dourado a dando ordens à criação. 0 cientista caminhará um pouco
mais antes de se ver obrigado a lançar um véu a que chama éter, e o
filósofo avançará ainda mais um pouco antes de lançar um véu a que chama
Absoluto, mas o iniciado caminhará mais do que todos, pois aprendeu a
avançar por meio dos símbolos, a os símbolos são para a mente o que as
ferramentas são para as mãos - uma aplicação ampliada de seus poderes.
4.
0 cabalista toma como ponto de partida a Kether, a Coroa, a Primeira
Sephirah, que ele simboliza pelo número Um, a Unidade, a pelo Ponto no
Círculo. Sobre essa Sephirah, ele lança os três Véus da Existência
Negativa. Esse processo difere bastante da tática de começar no
Absoluto, tentando remontar à evolução, e, embora possa não comunicar um
conhecimento imediatamente claro a completo da origem de todas as
coisas, ele faculta, não obstante, um ponto de partida à mente. E sem um
ponto de partida não temos esperança de chegar a um fim.
5. O
cabalista, portanto, começa, quando pode, no primeiro ponto que está ao
alcance da consciência finita. Kether equivale à forma mais transcendental
de Deus que podemos conceber, cujo Nome é Ehieh, traduzido na Versão
Autorizada da Bíblia como "Eu sou", ou, mais explicitamente, o Ser Puro,
Que Existe por Si Mesmo.
6. Mas essas palavras não passam de
palavras e, como tais, são incapazes de comunicar uma impressão à mente.
Para que tenham sentido, é precise relacioná-las a outras idéias. Só
poderemos compreender Kether quando estudarmos Chokmah, a Segunda
Sephirah, sua emanação; a só quando contemplarmos o desenvolvimento
completo das Dez Sephiroth estaremos prontos para nos aproximar de
Kether, mas, dessa vez, aproximar-nos-emos com os dados que nos fornecem
a chave de sua natureza. Quando se trabalha com a Árvore, é mais sábio
manter a marcha do que se deter num único ponto até dominá-lo, pois uma
coisa explica a outra, e é da compreensão das relações entre os
diferentes símbolos que surge a iluminação. Repetimos novamente: a
Árvore é um método de utilizar a mente, não um sistema de conhecimento.
7.
Mas, por enquanto, não nos estamos ocupando do estudo das Emanações, a
sim das origens que a mente humana é capaz de penetrar. Por mais
paradoxal que possa parecer, podemos remontar muito mais às origens
quando lançamos os Véus sobre elas do que quando tentamos penetrar as
trevas. Portanto resumiremos a posição de Kether numa sentença, a qual
talvez tenha pouco sentido para o estudante que se aproxima do assunto
pela primeira vez, embora ele a deva conservar na mente, pois seu
significado só ficará mais claro posteriormente. Ao faze-lo, atemo-nos à
antiga tradição esotérica de dar ao estudante um símbolo para incubar
até que este rebente a casca, dentro da mente, porquanto uma instrução
explícita nada lhe diria. A sentença germinal que lançamos na mente
subconsciente do leitor é essa: "Kether é a Malkuth do Imanifesto". Diz
Mathers (op. cit.): "0 oceano sem limites da luz negativa não ,procede
de um centro, pois não o possui. Ao contrário, é essa luz negativa que
concentra um centro, o qual é a primeira das Sephiroth manifestas,
Kether, a Coroa."
8. Essas palavras, em si mesmas, contêm
contradições a são incompreensíveis; a luz negativa é simplesmente uma
maneira de dizer que a coisa descrita, embora tendo certas qualidades em
comum com a luz, não é, no entanto, luz tal como a entendemos. Essa
sentença é bem pouco elucidativa no que respeita àquilo que pretende
descrever. Ela nos diz para não cometer o erro de pensar na luz como
luz, mas não nos diz como devemos concedera-la em sua essência, a isso
pela simples razão de que a mente não está equipada com as imagens que
podem representá-la; por conseguinte, devemos deixá-la até que o nosso
crescimento nos permita faze-lo. Não obstante, embora essas palavras não
nos falem tudo o que gostaríamos de conhecer, elas comunicam certas
imagens à imaginação; essas imagens caem na mente subconsciente a daí
são evocadas quando as idéias correlatas penetram essa Esfera. 0 método
cabalístico, utilizado praticamente como a ioga do Ocidente, permite,
desse modo, o crescimento progressivo da compreensão.
9. Os
cabalistas reconhecem quatro planos de manifestação, a três planos de
~estação, ou Existência Negativa. O primeiro destes chama-se ALIV, ou
Negatividade; o segundo,ALNSOPH, o Ilimitado; e o terceiro,AIIV SOPHAUR,
a Luz Ilimitada. É este último plano que concentra a Sephirah Kether.
Esses três termos correspondem aos três Véus da Existência Negativa que
pendem sobre Kether; em outras palavras, eles são os símbolos algébricos
com os quais podemos pensar naquilo que transcende o pensamento, mas
que ocultam, ao mesmo tempo, o que representam; são as máscaras das
realidades transcendentes. Se pensarmos nos estados de existência
negativa nos termos de algo que conhecemos, incorreremos em erro, pois,
seja o que for que eles possam ser, eles não podem ser o que pensamos,
porquanto são imanifestos. A expressão "Véus", por conseguinte,
ensina-nos a utilizar essas idéias como fichas, desprovidas de valor em
si mesmas, mas úteis para nós em nossos cálculos. Essa é a verdadeira
utilização de todos os símbolos; eles velam o que representam, até que
possamos reduzi-los a termos compreensíveis, permitindo-nos utilizar, em
nossos cálculos, idéias que de outra maneira seriam inconcebíveis. E
como a essência da Árvore reside no fato de que seus símbolos se
elucidam mutuamente graças às suas posições relativas, esses Véus servem
como o andaime do pensamento, habilitando-nos a marcar nossas posições
em regiões ainda não-cartografadas. Esses Véus, ou símbolos
não-concretos, não têm nenhum valor para nós, a menos que um lado do Véu
confine com uma terra conhecida. Os Véus, embora ocultem o que
representam, permitem-nos ver claramente aquilo para o que servem de
estrutura. Essa é a sua função, a única razão pela qual são utilizados. É
apenas devido às nossas limitações que necessitamos desses símbolos
insolúveis, mas a mente disciplinada na filosofia esotérica aprende
rapidamente a trabalhar com essas limitações, aceitando o véu como
símbolo daquilo que está além de seu alcance. Assim é o Caminho do
desenvolvimento da sabedoria, pois a mente cresce com aquilo de que se
alimenta, até que, subindo um dia a Kether, possa ela erguer os braços,
desvendar o Véu a contemplar a Luz Ilimitada. 0 esoterista não limita a
si mesmo declarando que o Desconhecido é Incognoscível, pois ele é,
acima de tudo, um evolucionista, a sabe que o que está fora de nosso
alcance hoje poderá ser alcançado no amanhã do tempo cósmico. Ele sabe,
também, que o tempo evolutivo é um assunto individual nos planos internos, sendo medido (não regulado) pela revolução da Terra em tomo de seu eixo.
10.
Esses três Véus - AIN, Negatividade; AIN SOPH, o Ilimitado; e AIN SOPH
AUR, a Luz Ilimitada -, embora não possamos esperar compreendê-los,
sugerem, não obstante, certas idéias às nossas mentes. A Negatividade
implica o Ser ou a existência de uma natureza que não podemos
compreender. Não podemos conceber uma coisa que é e que, no entanto, não
é; por conseguinte, devemos conceber uma forma de ser da qual nunca
tivemos qualquer experiência consciente; uma forma de ser que, de acordo
com nossos conceitos de existência, não existe e, no entanto, se assim
podemos nos expressar, existe de acordo com a sua própria idéia de
existência. Para empregar as palavras de um grande sábio: "Há muito mais
coisas no céu a na Terra do que as sonhadas por nossa filosofia".
11.
Entretanto, embora digamos que a Existência Negativa está fora do
alcance de nossa compreensão, isso não significa que estejamos fora do
âmbito de sua influência. Se assim fosse, poderíamos rejeitá-la por
não-existente no que nos diz respeito, a nosso interesse por ela
terminaria em definitivo. Ao contrário, embora não tenhamos acesso
direto ao seu ser, tudo o que conhecemos como existente tem suas raízes
nessa Existência Negativa, de maneira que, embora não possamos
conhecê-la diretamente, temos dela uma experiência indireta. Em outras
palavras, embora não possamos conhecer-lhe a natureza, conhecemos seus
efeitos, da mesma maneira como ignoramos a natureza da eletricidade,
embora sejamos capazes de utilizá-la em nossas vidas, estando
habilitados, pela nossa experiência sobre seus efeitos, a chegar a
certas conclusões concernentes pelo menos às qualidades que ela deve
possuir. Aqueles que penetraram mais profundamente no Invisível
comunicaram-nos descrições simbólicas por meio das quais podemos virar
nossas mentes na direção do Absoluto, ainda que não possamos alcançá-lo.
Eles falaram da Existência Negativa como Luz: "Ain Soph Aur, a Luz
Ilimitada." Falaram da Primeira Manifestação como Som: "No princípio era
a Palavra." Certa vez, disse-me um homem - um adepto, se é que jamais
houve algum: "Se quer saber o que Deus é, posso dizê-lo numa única
palavra: Deus é pressão." Imediatamente, uma imagem brotou em minha
mente, seguida de uma compreensão. Pude conceber a corrente da vida
fluindo por todos os canais da existência. Senti que uma compreensão
genuína da natureza de Deus me tinha sido comunicada. E, no entanto, se
alguém tentar analisar as palavras, nada há nelas; não obstante elas
tiveram o poder de comunicar uma imagem, um símbolo, à mente, e a mente,
operando no reino da intuição, situado além da esfera da razão,
alcançou uma compreensão, ainda que essa compreensão não possa ser
reduzida à esfera do pensamento concreto senão como uma imagem.
12.
Precisamos compreender claramente que, nessas regiões altamente
abstratas, a mente não pode utilizar senão símbolos: mas esses símbolos
têm o poder de comunicar compreensões às mentes que sabem como
utiliza-los; eles são as sementes de pensamento, de onde brota o
entendimento, ainda que não sejamos capazes de expandi-los a uma
realização concreta.
13. Pouco a pouco, como uma maré ascendente, a
compreensão vai concretizando o Abstrato, assimilando a expressando, nos
termos de sua própria natureza, coisas que pertencem a outra Esfera; a
cometeríamos um grande erro se tentássemos provar, com Herbert Spencer,
que, por ser uma coisa desconhecida em razão da capacidade mental que no
presente possuímos, essa coisa será para sempre Incognoscível. 0 tempo e
a evolução aumentam não só o nosso conhecimento, como também a nossa
capacidade; e a iniciação, que é a casa de força da evolução,
antecipando a produção das faculdades necessárias, permite à consciência
do adepto atingir vastas compreensões, até então abaixo do horizonte
mental humano. Essas idéias, embora claramente apreendidas por ele
através de um outro modo de conscientização, não podem ser comunicadas a
alguém que não partilha desse modo de conscientização. Ele só pode
expressá-las numa forma simbólica; mas toda mente que, de alguma
maneira, experimentou esse modo mais amplo de funcionamento será capaz
de assimilar essas idéias, embora seja incapaz de traduzi-las na esfera
da mente consciente. É por essa razão que, na literatura da ciência
esotérica, encontramos idéias germinais como "Deus é pressão" a "Kether é
a Malkuth da Existência Negativa". Essas imagens, cujo conteúdo não
pertence à nossa Esfera, são como os germes masculinos do pensamento que
fecundam o óvulo da compreensão correta. Em si mesmas, elas brilham
momentaneamente na consciência como um relâmpago fugidio de compreensão,
mas sem elas o óvulo do pensamento filosófico seria infértil. Ao
contrário, impregnado por elas, embora sua substância seja absorvida a
perdida no próprio ato de impregnação, esse óvulo se transforma, pelo
crescimento, no germe sem forma do pensamento e, por fim, após a devida
gestação além do limiar da consciência, a mente dá à luz uma idéia.
14.
Se desejamos obter o melhor de nossas mentes, devemos aprender a
conceder-lhes esse período de latência, essa impregnação por alguma
coisa que está fora de nosso plano de existência, permitindo-lhe a
gestação além do limiar da consciência. As invocações de uma cerimônia
de iniciação têm por objetivo atrair essa influência impregnante para a
consciência do candi-
dato. Eis a razão por que os Caminhos da
Árvore, que são os estágios de iluminação da alma, estão intimamente
associados ao simbolismo das cerimônias iniciáticas.
[Imagem by Google]
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